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    ilustrações: Grace Helmer

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    Entrevista: Blexbolex

    11.04.2016

     

    Já que Blexbolex foi assunto no post anterior, por que não escavar mais fundo no trabalho desse artista imenso do livro ilustrado infantil? E não é que encontramos pedras preciosas?

     

    A entrevista abaixo é um achado, um presente. O ilustrador Daniel Bueno entrevistou o autor em 2013 para o blog da Cosac Naify. Originalmente publicado em dezembro daquele ano e com exclusividade, esse texto tinha se perdido dos leitores desde que o site da editora saiu do ar. Aqui, eles voltam a se encontrar. Sorte a nossa!

     

    Nesse texto, cedido pelo Daniel e generosamente garimpado dos arquivos de ex-editoras da Cosac, há um pouco do mundo de cada um: palavra e imagem. Blexbolex, pseudônimo do escritor francês Bernard Grander, compartilha suas técnicas de ilustração, referências, preferências de linguagem e – o que mais nos interessa –, fala sobre as infâncias de quem lê e de quem escreve.

     

    Daniel Bueno: Em "Cantiga", chama a atenção o modo como você consegue efeitos gráficos belíssimos através da sobreposição de retículas estilizadas e sintéticas manchas de cor. O livro, em seu conjunto, é também muito bonito: o formato, tipografia, a lombada etc. Gostaria de saber um pouco sobre o planejamento e processo de criação desse livro. Você fez muitos esboços? Prevaleceu o trabalho manual ou você recorre bastante ao computador?

    Blexbolex: Geralmente não faço esboços, prefiro começar a trabalhar minhas imagens imediatamente no computador. Para esse livro, levando em consideração a complexidade do conteúdo narrativo das imagens, tive que fazer alguns esboços (parecidos com desenhos de storyboard) para assegurar que as imagens funcionariam bem nas ideias e composição geral. Neste caso, são desenhos bem pequenos, de alguns centímetros quadrados. Às vezes, a composição desse tipo de desenho é muito complicada, por isso escaneei alguns deles para servir de base às imagens finalizadas. Caso contrário, absolutamente tudo que faço é no computador.

     

    "Cantiga" apresenta uma narrativa interessantíssima com palavras soltas que se somam para contar uma história. No livro "Saisons" (Albin Michel Jeunesse, 2008) a abordagem é outra, mas você também explora a relação entre uma imagem e uma palavra por página. De onde vem o interesse por esse tipo de solução e quando começou?

    É difícil de responder. Pelo o que eu me lembro, as palavras, a linguagem são coisas que sempre me interessaram, na mesma medida que as imagens. As palavras são ideias (e ainda, isso não é completamente verdade) quando as dizemos, mais quando as escrevemos; são também imagens, por sua grafia, seu tamanho e eventualmente suas cores. E as imagens também são ideias porque elas evocam, mostram, contam. Sem dúvida, isso que estou dizendo é muito pouco e confuso. É uma coisa complexa. Para mim, as imagens são uma maneira de colocar em jogo todas essas coisas, com o objetivo de me surpreender, e aos outros também, caso queiram se prestar ao jogo pelo qual eu os convido a participar.

     

     

     

     

     

     

     

    Você estudou serigrafia na Escola de Belas Artes de Angoulême. Seus primeiros trabalhos para o mercado editorial já exploravam a serigrafia ou houve um processo inicial com tentativas em variadas técnicas?

    Eu fiz quadrinhos, um pouco de pintura; também me interessei pelo teatro, pela edição; tentei escrever, fiz um pouco de gravura no metal etc. Enfim, tentei todos os tipos de coisas, principalmente porque não sabia o que eu tinha vontade de fazer, o que pode ser às vezes uma vantagem ou um inconveniente. Em seguida, a oportunidade de trabalhar como tipógrafo em um escritório certamente foi decisiva.

     

    Você apresenta soluções diversas nos trabalhos que faz: em alguns casos há a exploração de retículas e em outros, por exemplo, vemos manchas de cor homogênea, muitas vezes com paleta reduzida. Gostaria que falasse um pouco sobre essas experimentações da técnica de serigrafia: as descobertas, eventuais “erros” aproveitados de modo interessante etc.

    Isto pode nos levar muito longe! Digamos simplesmente que a experimentação, o imprevisto (desejado ou não) fazem parte do meu trabalho. Sempre procuro atalhos, formas de sintetizar o que eu sei, o que me leva às vezes a fazer grandes desvios. Os processos que me levam à imagem me fazem sonhar, simplesmente.

     

    Conheço seu trabalho desde o final dos anos 1990, quando comprei um fanzine francês com uma HQ de sua autoria. Também tenho o Comix 2000 e outras publicações. Lembro que algumas dessas histórias eram feitas com traço despojado e expressivos rabiscos e garatujas. Fiquei curioso pra saber um pouco sobre seus quadrinhos, como começou a atuar nessa área. E quais são as HQs que gosta de ler e que influenciaram, de algum modo, seu trabalho?

    Fui um grande leitor de quadrinhos até o começo dos anos 1980. Depois, menos. As razões são que, quando eu era estudante, era levado a conhecer a história da arte – o que me encantou, e logo em seguida fui obrigado a ganhar a vida – o que foi difícil. Não tinha mais a mesma disponibilidade, e, é preciso dizer, não tinha mais dinheiro para seguir os quadrinhos que estavam sendo feitos naquela época.

    Tintin foi importante (leitura familiar!), em seguida Philménon de Fred, Corto Maltese, Moebius e Tardi quase ao mesmo tempo, como também Krazy Kat. Depois, uma descoberta muito importante no começo dos anos 1990, Gary Panter, e também Mark Beyer, Charles Burns, e os franceses Pascal Doury e Bruno Richard, muito importantes a meu ver, mas passando por Frans Masereel também, que não faz quadrinhos, mas histórias em imagens.

    Não consigo passar a lista completa de todos aqueles que me influenciaram: pegue o dicionário, a lista telefônica e a enciclopédia para começar.

     

    O que acha da produção e legado das vanguardas artísticas do começo do século passado? Há maior interesse por certos artistas?

    O fato de pensar minhas obras ao mesmo tempo de fazê-las em termos de impressão (serigrafia ou não), me levou a soluções próximas daquelas das de outros artistas anteriores a mim que já tinham experimentado ou praticado isso. Há também no princípio de redução dos meios uma elegância e uma inteligência que eu particularmente aprecio.

    Não faço nada além de sempre me “refazer” perguntas sobre esses meios e soluções em um contexto totalmente diferente. Idem, a lista será muito longa e não se trata de uma lista fechada.

     

    Você vê particularidades na ilustração de livros infantis europeus em relação a outros lugares do mundo (como os Estados Unidos, por exemplo)?

    Não sei. Vejo coisas novas e surpreendentes todos os dias, e vindas de todos os cantos do planeta, de épocas diferentes. Não vou me arriscar a dizer sobre alguma especificidade, se é que uma coisa dessas existe. Me contento em fazer aquilo que faço, sem me colocar muitas questões.

     

     

     

     

    Sua produção abrange desde livros para crianças até trabalhos para coletivos como United Dead Artists… As diferenças de público e finalidade das publicações interferem no seu trabalho? O que muda numa ilustração para crianças?

    Um professor que eu gostava muito dizia: “Há coisas que se pensam, outras que se dizem, outras que se escrevem”. Eu diria que se dirigir às crianças ou adultos é algo da mesma ordem. Trata-se menos de uma autocensura que da consciência das pessoas às quais nos dirigimos, mas tento encontrar uma linguagem que seja adequada em função daquilo que eu tenho a dizer ou compartilhar. Na verdade, me sinto muitas vezes mais livre e mais à vontade frente às crianças, não tenho necessidade de impor as coisas, a questão de autoridade se coloca infinitamente menos, se é que ela se impõe. As barreiras do mundo adulto são muitas vezes difíceis de transpor.

     

    Percebo que você escreveu parte considerável dos livros que já ilustrou. Você também faz muitos trabalhos sob encomenda, direcionados por briefings e conteúdos que não expressam necessariamente seus interesses? Como você enxerga a questão da liberdade criativa no seu trabalho?

    Muitas vezes sou ilustrador, o que significa que aceito uma encomenda e exigências. No interior dessas obrigações, cabe a mim descobrir a liberdade que é permitida, o que não é sempre muito fácil. Quando sou o autor, sou eu que fixo as obrigações e determino quando as ultrapassar, o que é ainda mais difícil.

     

    Há algum novo projeto em vista?

    Atualmente, sou ilustrador, é isso que me faz viver. Agora, as exigências de prazo estão terríveis! Isso quer dizer que vou passar meus dias e minhas noites para talvez chegar somente à metade daquilo que estou com vontade de fazer.

    Os projetos que eu poderia eventualmente trabalhar como autor me parecem longe! Totalmente fora de questão na verdade, se isso responde à sua pergunta!

     

    Entrevista originalmente publicada no blog da Cosac Naify, dezembro de 2013.

     

     

     

     

     

    Daniel Bueno é ilustrador, artista gráfico e quadrinista de São Paulo. Seu trabalho envolve contornos geométricos, colagem, texturas, pesquisa de grafismos e ilusão. "Tento escapar de soluções óbvias e um dos modos de fazer isso é deformar uma figura inicialmente redundante. O uso de elementos gráficos como entidades que podem ter outros significados também toma parte nesse processo." Como ilustrador, colaborou com mais de cinquenta revistas e jornais no Brasil e no exterior. Ilustrou três livros premiados com o Jabuti: “Um garoto chamado Rorbeto”, de Gabriel o Pensador, “O melhor time do mundo”, de Jorge Viveiros de Castro, e “A janela da esquina do meu primo”, de E. T. A. Hoffmann. Para visitar o seu trabalho, http://buenozine.com.br

     

     

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